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sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

VAR: O que nasceu para estabelecer “justiça” tornou-se mais um elemento de injustiça

 Sábado, 03 de Dezembro de 2022

Mais do que qualquer argumento, fico com a evidência: o gol da “mão de Deus” de Maradona contra a Inglaterra na Copa de 86 teria sido anulado pelo VAR, o que nos privaria de um dos momentos mais sublimes do futebol de todos os tempos. Gols como aquele fazem do futebol o que ele é: paixão, discussão, blefe.

Futebol é um jogo de truco, não de bridge.

Alguns dirão que só falo isso porque não sou inglês. Pode ser. Mas a Inglaterra não seria campeã do mundo em 1966 se houvesse VAR, com um gol decisivo que não entrou. As injustiças são aleatórias, assim como na vida.

Aliás, a palavra “justiça” é a que norteia toda a defesa do uso do VAR. Em tese, com a ajuda da tecnologia, as decisões seriam “justas” e acima de qualquer discussão. Obviamente, não é o que se tem visto.

O que nasceu como uma forma de evitar “erros grosseiros”, é usado para detectar “erros” que nem o Robocop seria capaz de ver. Desde linhas de impedimento até a definição de ultrapassagem da bola pela linha de fundo (como vimos ontem no jogo Japão x Alemanha), passando pela marcação de pênaltis, a “justiça” do VAR tem sido contestada por torcedores e jogadores. O que nasceu para estabelecer “justiça” tornou-se mais um elemento de injustiça.

E este é o ponto fundamental de toda essa discussão: a busca da “justiça perfeita” é inútil e vã. Os seres humanos somos falhos por natureza, não existe a perfeição.

A tentativa de ser “mais justo” com o auxílio da tecnologia só introduz injustiças de outra ordem.

Quer coisa mais injusta do que exigir dos jogadores que joguem contra uma máquina, que decidirá se a protuberância dentro do seu calção está à frente do zagueiro na imagem 3D?

Aqui volto ao ponto inicial: o gol da “mão de Deus” foi fruto de uma ilusão de ótica genial, que somente um dos mais geniais jogadores de futebol de todos os tempos seria capaz de realizar. Mas isso só foi possível porque os jogadores, que são seres humanos, estão lidando com outro ser humano, o juiz, e não com uma máquina.

A “justiça” no futebol está em que seres humanos julgam seres humanos. Os erros fazem parte do jogo, assim como fazem parte da vida. O futebol é o que é porque imita a vida. E a vida é “injusta” por natureza.

Marcelo Guterman. Engenheiro de Produção pela Escola Politécnica da USP e mestre em Economia e Finanças pelo Insper.

  • Fonte: Jornal da cidade Online

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