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sábado, 2 de dezembro de 2023

STF continua defensor da liberdade de imprensa ou mudou de lado?

Sábado, 02 de dezembro de 2023

Reprodução

Capitaneados por Alexandre de Moraes, os atuais ministros do Supremo Tribunal Federal mostraram-se dispostos, na última quarta-feira (29), a inaugurar um capítulo sombrio na história da corte.

Como se ignorassem que o STF tem longa tradição na defesa inequívoca da liberdade de imprensa, resolveram flexibilizá-la; como se desconhecessem a relação vital entre democracia e liberdade de informação jornalística, cercearam esta e arriscaram aquela; como se pudessem desconsiderar a Constituição, deram as costas para ela.

Não são outras as consequências do julgamento sobre um pedido de indenização feito ao Diário de Pernambuco por conteúdo publicado em 1995, no qual o STF deliberou que o veículo de comunicação pode ser responsabilizado na esfera civil pelas declarações de um entrevistado que impute falsamente prática de crime a terceiro.

O que seria apenas uma decisão absurda tomada por um órgão judicial adquiriu outra dimensão quando o Supremo, sem necessidade, optou por extrapolar do caso concreto para o universal, fixando uma tese geral a ser utilizada como baliza em situações semelhantes.

De acordo com o STF, na hipótese de um entrevistado atribuir a outrem a prática de um crime, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada se, “à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação” e, ao mesmo tempo, o veículo não tiver observado “o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos”.

Ainda que a dupla condicionante tenha em tese o condão de demonstrar quão excepcionais devem ser as circunstâncias para possibilitar a sanção, seu efeito pode ser o oposto: a nova regra abre mais brechas do que fecha e deixa a imprensa mais vulnerável.

Os pequenos veículos, em particular, sem recursos para manter um departamento jurídico, ficarão à mercê do que juízes entenderão como “indício concreto” e “dever de cuidado” —um prejuízo de monta para a liberdade jornalística, sobretudo quando se conhece o grau de promiscuidade entre poderosos país afora.

Mesmo a chamada grande mídia, em tese mais capacitada para enfrentar o assédio judicial, poderá vir a exercer alguma autocensura, sacrificando a circulação da informação para evitar arbitrariedades.

Mede-se o tamanho desse golpe pela régua da Constituição, que rechaça qualquer embaraço à “plena liberdade de informação jornalística”. Repita-se, por ênfase: plena.

Embora o julgamento tenha sido encerrado, e a tese geral, estabelecida, ainda há tempo de minimizar seus efeitos mais nocivos. É imperioso que o relator do acórdão, Edson Fachin, afaste ambiguidades da decisão, dirima dúvidas e esclareça se o STF continua defensor intransigente da liberdade de imprensa ou se mudou de lado.

Opinião- Folha de São Paulo

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