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domingo, 24 de março de 2024

Taxa de suicídio entre crianças e jovens aumenta 3,7% no Brasil; No mundo, o índice caiu 36%

Domingo, 24 de março de 2024

Foto: Photographee.eu/Adobe Stock

Na contramão da tendência global de queda no número de suicídios, um estudo da Fiocruz apontou que o Brasil registrou aumento de 3,7% nas taxas de suicídio e de 21% nos casos de automutilação de 2011 a 2022.

Apesar de o problema ser mais comum entre idosos, o aumento foi mais significativo no grupo de jovens de 10 a 24 anos: houve crescimento de 6% nas taxas de suicídio e de 29% nas taxas de autolesão. Enquanto a redução global de casos foi de 36%, nas Américas o aumento foi de 17%.

A constatação é de um amplo estudo realizado pelo Cidacs (Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para a Saúde), da Fiocruz Bahia, em colaboração com pesquisadores de Universidade Harvard, nos Estados Unidos.

Para chegar aos resultados, os pesquisadores analisaram mais de 1 milhão de dados disponíveis em 3 bases públicas: o SIM (Sistema de Informações sobre Mortalidade), SIH (Sistema de Informações Hospitalares) e o Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação). Os resultados foram publicados na The Lancet Regional Health – Americas.

De acordo com a psicóloga Flávia Jôse Alves, pesquisadora do Cidacs, responsável pelo estudo, esse trabalho é parte do escopo de uma pesquisa maior, que avalia informações de saúde mental como um todo.

“As taxas de suicídio têm decrescido globalmente, mas no Brasil e na América Latina têm aumentado. Queríamos tentar entender como isso vem acontecendo e resolvemos cruzar as informações das 3 bases de dados públicas, que são totalmente independentes e não se conversam”, disse Flávia.

Após a análise estatística, um dos dados que chamou a atenção da pesquisadora é que os índices de suicídio registrados no período têm mantido um crescimento constante e não houve um aumento ou pico considerável durante a pandemia, ao contrário do que seria esperado por causa do aumento de casos envolvendo problemas de saúde mental. “O registro de suicídios permaneceu com uma tendência persistente ao longo do tempo”, afirmou a psicóloga.

Outro dado que chamou a atenção é que houve o aumento de registros em todos os grupos (indígenas, pardos, asiáticos, negros e brancos), mas o número de notificações e de mortes foi maior entre os indígenas e, dentre eles, houve menor taxa de hospitalizações.

Na avaliação da pesquisadora, os fatos sugerem que há a falta de acesso aos serviços de urgência e emergência, o que poderia atrasar as intervenções.

POR QUE O AUMENTO ENTRE OS JOVENS?

Em relação ao aumento de casos em pessoas cada vez mais jovens, Flávia disse que a pesquisa não avaliou os motivos, mas elenca algumas hipóteses que poderiam explicar: dentre elas, fatores socioeconômicos que impactam diretamente o acesso aos cuidados básicos de saúde, especialmente a saúde mental –isso inclui desde a falta de médicos especialistas na rede até a resistência em procurar ajuda quando o problema envolve saúde mental. Além disso, o isolamento social também é um fator que preocupa.

O psiquiatra Elton Kanomata, do Hospital Israelita Albert Einstein, concorda e ressalta que a falta de acesso ao médico especialista é um problema sério. “Ainda há um deficit de psiquiatras em muitas regiões do Brasil e, tirando as capitais e os grandes centros, há uma enorme escassez de especialistas, o que dificulta a adequada condução dos casos para que eles não evoluam para um grande sofrimento psíquico e, consequentemente, o suicídio”, declarou.

Kanomata afirma que o aumento mais expressivo dos casos na faixa etária mais jovem é algo que tem sido observado rotineiramente por colegas que trabalham com saúde mental. “São gerações mais atuais, muito diferentes das anteriores. São jovens que tiveram acesso a recursos, informações, educação, mas possuem um perfil mais imediatista. Eles tendem a ter um menor limiar, uma baixa tolerância à frustração, e esse também pode ser um dos motivos”, sugeriu o médico.

Além disso, Kanomata citou outros fatores de risco que podem ter aumentado ao longo do tempo –dentre eles os níveis de estresse e as autodemandas dos tempos atuais. “Antigamente não se falava em burnout e hoje ele é um transtorno reconhecido pela Organização Mundial da Saúde no CID 11. Estamos vivendo um momento em que talvez essas atuais gerações não estejam conseguindo lidar com o aumento do estresse”, declarou.

COMO IDENTIFICAR ALGUÉM EM RISCO? 

O psiquiatra diz que muitas vezes é possível identificar sinais que indicam que uma pessoa está em sofrimento psíquico intenso, como grau de humor mais entristecido, apatia, diminuição de interesses, falta de vontade, de energia, de disposição para realizar atividades básicas, prejuízos com o autocuidado, redução do contato social ou isolamento, alterações de apetite e de sono e discurso mais pessimista em relação à vida e ao futuro.

“São detalhes que, se aparecem de forma sustentada e se tornam constantes, merecem atenção, para que a pessoa procure profissionais da área da saúde mental, tanto psiquiatras quanto psicólogos”, declarou Kanomata.

Em caso de necessidade de apoio emocional, o CVV (Centro de Valorização da Vida) recebe ligações gratuitas por meio do telefone 188. O site Mapa da Saúde Mental também pode ser usado para encontrar um serviço mais próximo.

Poder 360

OPINIÃO DOS LEITORES

  1. Várias pessoas da área da saúde me dizem que os suicídios são sub-notificados, “para não incentivar as pessoas”…

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Contato : (84) 9 9151-0643

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