Atacante fala sobre o momento da seleção, os tabus do futebol feminino, da parceria com Marta, elege o goleiro Fábio o jogador mais bonito do país

Uma das estrelas da seleção feminina de futebol, Cristiane lamenta ainda não ter ganhado um título de expressão à frente da Seleção Brasileira. A geração da atacante chegou muito perto algumas vezes. Levou a medalha de prata nas Olimpíadas de 2004 e 2008. Ficou com o vice no Mundial de 2007, na China. Agora em 2012, uma nova chance em Londres.
- Quero ser campeã de algo grande! - diz.
Em entrevista exclusiva ao GLOBOESPORTE.COM, Cristiane fala sobre alguns tabus do futebol feminino como a homossexualidade. Comenta a parceria com Marta na Seleção e torce para a companheira levar novamente o prêmio de melhor do mundo pela Fifa. Elege o goleiro Fábio como o jogador mais bonito do país e volta a reclamar da falta de apoio para o esporte no Brasil.
  GLOBOESPORTE.COM: O assunto é repetitivo. Mas a situação do  futebol feminino no Brasil melhorou? O que você acha do trabalho  desenvolvido pela CBF?
 CRISTIANE: A CBF podia divulgar mais a seleção feminina. Nós  estamos em terceiro no ranking e não temos o merecido reconhecimento. O  ideal era ter uma pessoa para cuidar só da gente. Nós fazemos parte de  uma seleção principal, não de base. Precisamos disputar mais amistosos  internacionais. Só viajamos quando outra seleção paga tudo. Nesse ano,  por exemplo, não jogamos fora.
  Falta organização ao futebol feminino no Brasil?
 Tem que ter um calendário pronto, com a previsão dos nossos treinamentos e amistosos até as Olimpíadas.
  O que você achou da escolha do técnico Jorge Barcellos?
 Espero que a nossa caminhada seja melhor com ele. O que erramos pode  ser consertado. Ganhamos o Pan-Americano e muitas medalhas em Olimpíadas  e Copa do Mundo.
  Você pretende disputar as Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro?
 Quero ser campeã de algo grande. Não aguento mais ser vice. Muitas  meninas vão jogar só no ano que vem. Eu tenho 26 anos, acho que tenho  mais três Olimpíadas pela frente. Quem sabe vou até 2020.
  Você gostou de ser fotografada para o catálogo sensual do Santos?
 Lá fora é feito bastante isso. É um tipo de divulgação para chamar a  torcida para os estádios. No Santos, também apoiamos o combate ao câncer  de mama. Por que não usar nós no lugar das modelos? Muita gente comprou  os calendários nas lojas e nós distribuímos nos jogos. É bom para as  pessoas tirarem da cabeça que o futebol é só para homem.
  Como deve ser tratada a homossexualidade no futebol feminino?
 Acontece em todos os ambientes. Mas o que acontece com o futebol é que  ele é visto como um esporte masculino. Mas o atleta tem que ser  respeitado, ter seu trabalho reconhecido. Vivemos num país muito  preconceituoso.

  É possível ser vaidosa no meio futebolístico?
 Infelizmente, cuidar do cabelo é muito difícil. Ou ele está com barro  ou com grama e neve. Tenho marcas pelo corpo todo. Mas não posso deixar  as unhas encravarem. Já perdi unhas várias vezes. No futebol, não dá  para ter tanta vaidade como as meninas que jogam vôlei. O importante é  se sentir bem.
  Você gosta de jogar essas peladas nas férias junto com os homens?
 Jogo com os homens também. Já estou com agenda lotada. Aos 12 anos, eu  fui inscrita num campeonato para jogar ao lado dos homens. Como eu  deixava todo mundo no chão e fazia muitos gols, o treinador decidiu me  tirar da equipe e criar um time feminino com medo de os adversários me  machucarem. Eu apanhava muito mesmo. Muitos queriam me bater e me ver  fora do time.
  Qual o jogador mais bonito do Brasil? O Fábio, o Ronaldinho Gaúcho e o Fred foram os finalistas do troféu Largo Tudo...
Voto  no Fábio, goleiro do Cruzeiro. Não há preconceito com o pessoal de trás  (risos). O Ronaldinho é simpático, bonito não. O Fred faz muitos gols.

FIFA (Foto: Divulgação / Arquivo Pessoal)
  Você admira a beleza de outros jogadores que atuam no exterior?
 O Cristiano Ronaldo é boa pinta. O Beckham e o Piqué também chamam a  atenção. Conheci o Cristiano Ronaldo no prêmio da Fifa. Só nos  cumprimentamos. Não deu para conversar direito porque ele só anda  cercado de seguranças. O Kaká também é lindo e muito simpático.
  O Neymar é seu amigo? Vocês jogaram no mesmo clube em 2011...
 Não o conheci pessoalmente. Mas as meninas da seleção, que também são  Atletas de Cristo, iam à igreja com ele. Eu adoro futebol. Vejo tudo o  que passa na televisão. Não tem o que se falar dele. É um excelente  atleta, lindo de se ver jogar. Estava na Vila Belmiro quando aconteceu  aquele Flamengo x Santos. Foi a melhor partida que já assisti.
  Em qual jogador(a) você se inspira?
 Atacante admira atacante. Sempre gostei do Ronaldo e do Ronaldinho. Mas  a preparação entre homens e mulheres é bem diferente. O trabalho nosso  não é tão forçado. Há diferença no testes e no percentual de gordura.

brasileira (Foto: Getty Images)
  Você acha que a Marta vai ser eleita a melhor jogadora do mundo novamente pela Fifa?
 Se eles (Fifa) colocarem como requisito a Copa do Mundo, acho que a  Homare Sawa tem grande chance de levar o título, justamente porque o  Japão foi campeão e ela o grande destaque. Agora se a Fifa analisar  pelos clubes, o que a atleta fez durante o ano, a Marta tem tudo para  levar (o prêmio). O problema é que a gente nunca sabe como eles (os  dirigentes da Fifa) contam.

Cristiane dá uma cambalhota ao vibrar com um dos gols pela seleção brasileira (Foto: Reuters)
  Você a Marta se completam em campo?
 Não tenho a velocidade dela, mas consigo aplicar bons dribles dentro da área. Não dá para comprar. São estilos bem diferentes.
  Como é a sua relação com a Marta?
 Conversamos muito na seleção. Fora isso, perdemos um pouco o contato  por causa da distância. A gente se dá muito bem no ataque, mas cada uma  tem suas melhores amigas na equipe.
Cristiane está jogando na Russia(Foto: Divulgação / Arquivo Pessoal)
  Como é jogar na Rússia?
 Para mim está sendo diferente porque é uma equipe que se coloca muito  para baixo. Perguntam o que eu e mais duas brasileiras estamos fazendo  lá. Mas, na verdade, é uma equipe boa. A gente está tentando mudar um  pouco a mentalidade das meninas. Tentamos passar que elas são capazes. O  frio atrapalha um pouco. Não tem jeito. Não consigo me adaptar com  isso. Elas falam que são ruins, mas eu não consigo chutar como elas  chutam. Elas batem com a esquerda, direita. Eu só consigo com a canhota.  São fortes e se posicionam muito bem. Mas não dá para comparar o  brasileiro ou a brasileira com nenhum outro atleta. Somos diferenciados.  Temos jogo de cintura e facilidade de jogar. Talvez até uma técnica  maior. O Campeonato Russo é forte, mas o nosso maior objetivo é a Liga  dos Campeões.
  Você pretende continuar no futebol russo?
 Pretendo renovar até quando eles (os russos) quiserem. Quero ficar lá  pelo menos por mais 10 meses, até as Olimpíadas de 2012. Estamos nas  quartas de final da Copa da Uefa e em primeiro no Campeonato Russo, com  seis pontos de vantagem para o segundo colocado. Não tenho do que  reclamar.
Joguei dois anos nos Estados Unidos, em 2009 e 2010. No primeiro ano fui muito bem. Mas no segundo tive um pouco mais de dificuldade, jogava de meia e de lateral. Venho realizando aos poucos os meus sonhos. O melhor campeonato que se tem hoje é a Liga Americana, justamente por reunir as melhores jogadoras. Aqui ainda falta muita coisa, inclusive gente preparada para trabalhar no futebol feminino. Parece que você acaba até regredindo no que você faz. Você tem que ter o apoio merecido e gente profissional mesmo para trabalhar com as mulheres. A realidade do futebol nos Estados Unidos é bem distante da nossa. Infelizmente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário