Trata-se de uma nova frente para que o País vença uma de suas maiores mazelas. E os empresários terão papel fundamental nessa batalha. Mais uma batalha dessa guerra sem fim.
“Pegue qualquer pesquisa sobre criminalidade e você verá que a presunção da impunidade é sempre um fator motivador para o criminoso. Quando essa motivação se dá na esfera dos crimes que envolvem práticas como suborno a agentes públicos, para a obtenção de vantagens de qualquer natureza, a quase certeza de que a punição – se e quando vier a acontecer, será branda, leva uma quantidade considerável de pessoas a avaliar que a relação custo x benefício de corromper, ou se deixar corromper por um agente público, vale muito à pena”, diz o advogado Bruno Maeda, coordenador do comitê de compliance do IBRADEMP, o Instituto Brasileiro de Direito Empresarial.
Mas o Ministerio Público está lambendo a rapadura. Em todos os níveis da federação o fiscal da lei já promoveu seminários e amplia o debate. Ponteio teve acesso a um desses estudos preliminares e transcreve as seguintes conclusões:
1) O artigo 25 da Lei 12.846/2013 deve ser interpretado à luz do artigo 37, par. 5o, da Constituição Federal, não podendo a prescrição quinquenal ser aplicada para impedir a reparação integral dos danos causados, mas incidir apenas sobre as demais sanções às pessoas jurídicas infratoras, contidas no artigo 19 da Lei Anticorrupção.
2) A Lei n. 12.846/2013, por orientação de seu artigo 30, deve ser interpretada sistematicamente com a Lei 8.429/92, podendo a pessoa jurídica ficar sujeita, no que couber, as sanções previstas no artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa, desde que comprovado o dolo ou a culpa de seus dirigentes ou administradores, e, cumulativamente, as penalidades da Lei Anticorrupção; esta legislação, por contemplar a responsabilização objetiva (administrativa e civil), torna menos complexa a atuação do Ministério Público, a quem cabe apenas a demonstração da prática do ato ilícito e do seu nexo de causalidade com os prejuízos causados, ao passo que compete à pessoa jurídica demandada o ônus da prova das causas excludentes do nexo causal .
3) A Lei 12.846/2013, nos termos de seu artigo 30, também, deve ser compatibilizada com a Lei 8.666/93 e as demais regras que versem sobrelicitações e contratos administrativos para que o valor da multa imposta observe os parâmetros dos artigos 6o, inc. I, e 7o da Lei 12.846/2013, nunca sendo inferior à vantagem auferida, mas também que incida outras sanções, em especial o impedimento para licitar e contratar com o Poder Público, por prazo determinado, (arts. 87-88 da Lei de Licitações e 47 da Lei 12.462/2011), embora a harmonização das sanções deva respeitar o critério adotado em cada legislação sobre a forma de responsabilização, objetiva ou subjetiva.
4) A não previsão pela Lei 12.846/2013 do impedimento de licitar e contratar com o poder público, por prazo determinado, ou da declaração de idoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública não pode conduzir a imposição destas sanções no processo administrativo de responsabilização objetiva das pessoas jurídicas infratoras, em razão do princípio da tipicidade, que exige que a sanção administrativa conste previamente em lei (exegese dos artigos 5o, inc. XXXIX, e par. 2o, e 37, caput,CF). Tal como asseverado nas conclusões 2 e 3 supra, contudo, como a aplicação das sanções previstas na Lei 12.846/2013 não afeta os processos de responsabilização e aplicação das penalidades contidas nas Leis 8.666/93 (arts. 87-88) e 12.462/2011 (art. 47), a autoridade administrativa deve impô-las às pessoas jurídicas infratoras que praticarem os atos ilícitos ali descritos, embora tal responsabilização dependa da comprovação do dolo ou da culpa.
5) Constatada omissão – total ou parcial – da autoridade administrativa na imposição plena das sanções administrativas previstas em lei, caberá ao Ministério Público ajuizar ação civil pública para promover a responsabilização administrativa integral da pessoa jurídica infratora (interpretação conjunta dos arts. 20 e 30 da Lei 12.846/2013).
6) O rol dos atos lesivos à Administração Pública, contido no artigo 5o da Lei 12.846/2013, é exemplificativo, devendo tal regra ser interpretada teleologicamente, para punir todo ato, praticado por pessoa jurídica, que atentar contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, ou contra os princípios da administração pública, ou, ainda, contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.
7) Não é indispensável a existência de dano efetivo para a responsabilização objetiva da pessoa jurídica, devendo cada hipótese ser analisada à luz do tipo descrito no artigo 5o da Lei 12.846/2013, a fortiori a obtenção, ou não, da vantagem, e a consumação, ou não, da infração são critérios para a aplicação das sanções (arts. 7o, inc. II e III, e 19, par. 4o, da Lei Anticorrupção).
8) São passíveis de responsabilização civil objetiva as ações das pessoas jurídicas que dificultarem as atividades de investigação ou de fiscalização do Ministério Público, no inquérito civil e na ação civil pública, como a sonegação indevida de informações, a destruição de elementos de provas, a criação de obstáculos ao exame de documentos ou a realização de perícias (exegese do artigo 5o, inc. V, combinado com o artigo 19 da Lei 12.846/2013). Nesta hipótese, se a pessoa jurídica infratora for condenada em danos morais coletivos, os valores deverão ser revertidos em benefício do próprio Ministério Público (art. 24 da Lei 12.846/2013).
9) O Ministério Público, apesar de não participar dos acordos de leniência (arts. 16-17 da Lei 12.846/2013), deve ter acesso aos termos do acordo – ainda que sigilosos1 – para que possa desenvolver investigações, em conjunto ou em paralelo com os órgãos da administração (arts. 129, incs. VI e VIII, CF, art. 26, inc. I, “c”, da Lei 8.625/93 e 8o, inc. II, da Lei Complementar 75/93), verificar a legalidade, a moralidade e a efetividade dos acordos celebrados e, se constatar a omissão das autoridades competentes, ajuizar ação civil pública para promover a integral responsabilização da pessoa jurídica infratora ou, caso os acordos de leniência estiverem em desacordo com o ordenamento jurídico, buscar a sua anulação judicial.
10) Embora não exista previsão expressa, por força da interpretação teleológica do artigo 21 da Lei Anticorrupção, que remete ao rito da Lei 7.347/85, é cabível o compromisso de ajustamento de conduta (art. 5o, par. 6o, da Lei de Ação Civil Pública), por iniciativa do Ministério Público, para a reparação integral dos danos causados pela pessoa jurídica infratora, tornando, para este fim, prescindível o ajuizamento da ação prevista no artigo 19 da Lei 12.846/20132.
A lei é dura
O poder público não precisa mais provar que uma empresa que factualmente se envolveu em um ato de corrupção com agentes governamentais, se beneficiou desse ato. Basta a prova de que a corrupção existiu. E não adianta transferir a responsabilidade para um funcionário da empresa – o que costumava acontecer na grande maioria dos casos de escândalos de corrupção, e deixar que ele seja o único a arcar com as consequências do problema.
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Portal noar Aluisio Lacerda