Segunda, 01 de setembro de 2025
O promotor de Justiça Lincoln Gakiya, que há mais de duas décadas se dedica a combater o Primeiro Comando da Capital (PCC), está pessimista quanto ao sucesso da missão. A facção, nascida em presídios de São Paulo, já expandiu sua atuação para 28 países e consolidou presença no tráfico de drogas, além de ter influência na economia e política no Brasil.
Gakiya integra o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado do Ministério Público de São Paulo em Presidente Prudente. Ele afirma que o PCC nunca foi tão poderoso quanto atualmente, seja em faturamento, presença global ou capacidade de atuação na economia formal.
Narcoestado
Em entrevista ao jornal O Globo, publicada neste sábado, 30, Gakiya diz ser impossível rastrear em quantas atividades do mercado formal o PCC já se infiltrou. O promotor ressalta que, sem uma agência nacional para unificar o combate ao crime organizado, existe o risco de o Brasil transformar-se em um narcoestado em até três décadas.
“O PCC já pode ser classificado como uma organização mafiosa”, destaca. “Não precisa mais da ostensividade da violência, exibindo fuzis e praticando crimes cinematográficos. Ele já passou dessa fase, está ganhando muito dinheiro, principalmente com o tráfico internacional de cocaína para a Europa.”
O retorno do dinheiro ilegal exige inserção na economia formal, frequentemente por meio de empresas legítimas com funcionários e serviços reais, o que dificulta o rastreamento pelas autoridades. Gakyia conta que, há pelo menos dez anos, o PCC começou a lavar dinheiro por meio da compra de postos de gasolina e concessionárias de veículos
“Antigamente, o PCC montava empresas de fachada, mais simples de detectar. Agora, as empresas são lícitas, têm funcionários, prestam serviços reais e têm capital da facção”, relata. “É muito difícil dimensionar em que negócios o PCC está. É mais fácil dizer em qual ramo da economia ele não está.”
A respeito da sobreposição entre ações do Ministério Público e da Polícia Federal (PF), Gakiya diz que a falta de integração entre órgãos é um obstáculo significativo. “O maior desafio do Brasil, hoje, em termos de segurança pública, é coordenação e integração.” Ele defende a criação de uma agência para coordenar e tornar mais eficiente o combate ao crime organizado.
Criação de uma agência antimáfia
“Sou a favor da criação de uma agência antimáfia. Nós já temos máfia no Brasil, o PCC já é uma organização mafiosa.” A proposta consistiria em um órgão composto por todas as instituições. Atualmente, não há subordinação entre as instituições, “cada uma tem seu ramo de atuação, suas expectativas, sua formação e gera muita disputa institucional”.
O diretor da PF, Andrei Rodrigues, já afirmou em público ser contrário à criação de uma agência antimáfia, sob o argumento de que a própria instituição cumpre esse papel. Entretanto, Gakyia rebate: “se tivesse suprido o papel de fazer essa integração entre as instituições, não estaríamos no estado que estamos agora”.
Estado paralelo
O promotor alerta que o país vive um processo de consolidação de um Estado paralelo, com o risco de se tornar um narcoestado em até 30 anos, caso nenhuma medida seja adotada. “O crime organizado está num processo de crescimento exponencial”, ressalta. “E ninguém sabe onde isso vai chegar.”
Um narcoestado envolve o domínio da política institucional. “Quando o crime começa a dominar as prefeituras, as câmaras municipais, e depois a ter influência sobre os governos estaduais, pode chegar a eleger um presidente ou então ter ligações diretas com o presidente”, explicou Gakyia. “É isso que precisamos evitar.”
Uma consolidação de influência, aliás, pode estar em curso. “No ano que vem, teremos campanhas e é bem possível que o PCC também esteja financiando algum candidato.” A facção “tem todo o interesse, estando na economia formal, de participar dessa fatia do bolo, ou seja, de licitações ou dos negócios públicos”, diz o promotor. “Quando você elege representante, seja no Legislativo, seja no Executivo, você vai cobrar a conta depois.”
Revista Oeste
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