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segunda-feira, 23 de abril de 2018

Eleitores de Lula não querem plano B, só ‘plano L’, e apontam falhas na esquerda

Segunda,23 de Abril de 2018


No último dia 12, cinco após a prisão do ex-presidente, a Folha reuniu dez eleitores do petista em São Paulo para debater perspectivas para a eleição e o futuro do lulismo. Todos dizem que não arredam pé de apoiar Lula naquela que, se a Justiça permitir sua candidatura, será sua tentativa de reaver a faixa presidencial —conquistou-a em 2002 e 2006 depois de três tentativas frustradas.

Admitir uma alternativa ao ex-presidente, diz o advogado Geovani Doratiotto, 28, “é acreditar que o que aconteceu com Lula é o correto, o justo”. E isso o grupo não está disposto a tolerar —fiel depositário do slogan esquerdista “eleição sem Lula é fraude”, ainda que a cúpula do PT discuta nos bastidores o que fazer caso ele seja impedido de disputar o pleito em outubro.

Mas o campo progressista precisa ficar esperto, “pois tem um pouco de dificuldade de sintetizar seu discurso e não conversa com o grande público”, afirma a educadora social Rachel Daniel, 22. A direita é boa de bordões que colam no povo, vide “bandido bom é bandido morto”, exemplifica a evangélica da zona leste paulistana. “A esquerda, quando vai rebater, não tem uma frase midiática.”

Os dois maiores espinhos judiciais contra Lula, o sítio em Atibaia (ainda em julgamento) e o tríplex no Guarujá (que lhe rendeu, na segunda instância, 12 anos de prisão) são tratados como “falhas mínimas” perto do que se vê em Brasília. Se Lula tombar por conta deles, a Justiça vestirá de vez a carapuça política, mandando a isenção que se requer dos togados às favas, afirmam seus apoiadores.

É uma turma heterogênea. O caçula Alexandre Leone, 21, sequer trocou o DDD para o 11 paulistano no número de celular: o soteropolitano já bacharel em Humanidades chegou há um mês à capital do estado para estudar na Faculdade de Direito da USP, por onde já passaram 13 presidentes (Michel Temer entre eles) e petistas como Fernando Haddad.

Decano, o servidor público Paulo Drads, 62, se introduz como “um caipira de Mariápolis [SP]”. Sua formação política coincide com a de Lula: os dois trabalharam na Aço Villares, em São Bernardo do Campo.

Em entrevista à revista Veja em 1979, o torneiro mecânico de 33 anos apostava que a fábrica o demitiria por desgostar de sua ascensão como líder sindical, e sua esposa, Marisa Letícia (1950-2017), o acalmava: “Se for preciso, eu trabalho de faxineira. Nós não temos medo do futuro”.

A exaltação de programas sociais como o Bolsa Família é unânime. No grupo, tem os que de fato recorreram a eles em algum momento da vida. Caso da engenheira agrônoma Mariana Martins, 33. Primeira universitária de sua família, ela conta que sempre precisou de assistência do governo, até para ir ao dentista.

Os parentes, diz, não deram crédito a Lula, e sim “à meritocracia” por suas conquistas. “Hoje são viúvas de Aécio Neves” (o tucano derrotado pela petista Dilma em 2014).

E tem também o estudante de direito Gabriel Berê Motta, 23, “típico paulistano de classe média”, que estudou no “ultratradicional Dante Alighieri” (hoje, a mensalidade beira os R$ 3.600 para o ensino médio).

“A minha percepção veio da minha criação. Meu pai tem origem mais humilde, é do interior de Minas, uma cidade muito pobre.” Ao contrário da família de Mariana, a sua associa a bonança social ao lulismo, diz.

O temor pelo futuro do PT e de seu ícone encarcerado é um cálice que eles tentam afastar. “Dá pra sentir que [a prisão de Lula] poderia ter sido a última pá, mas jogaram uma pedra na colmeia”, diz a professora da rede municipal Luciana Nascimento, 39. “Deu sangue no olho da esquerda, foi até bom para unificar.”

O que também os uniu: quase todos fizeram a mesma piada ao ver na mesa os sanduíches à disposição. Lembraram de uma certa iguaria atribuída à militância vermelha. “Não tem de mortadela?”


Folha de São Paulo

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