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domingo, 28 de fevereiro de 2016

Prosa do Domingo


Em 28 de fevereiro de 2016  

por François Silvestre 

A federação que nunca houve.

O Brasil não foi e não é uma federação. O que é uma Federação? É uma União política, republicana, formada por membros autônomos, que possuem Constituição própria e legislação específica. Cuja vigência e eficácia, no seu território, tem prevalência sobre as leis gerais da União, à exceção da Constituição Federal.

Qual desses conceitos se aplica, na prática, ao Brasil? Nenhum. E todos, só que teoricamente acanalhados.

E qual órgão constitucionalmente instituído deve cuidar da existência da federação, zelar por sua manutenção e eficácia? O Senado Federal. A falsidade nasce na não existência da federação e se consolida na inutilidade do órgão protetor.

O Senado era uma casa imperial formada por sustentadores do Império. Ricos que mantinham a família real e influentes que se mantinham na bajulação ao imperador.

Os senadores eram eleitos pelas províncias, mas só assumiam o posto, vitalício, por acatamento do imperador. Casos houve em que a província elegia o senador e este nunca tomava assento à casa. Um exemplo: José de Alencar, eleito pela província do Ceará, nunca foi nomeado senador. D. Pedro não aceitava sua independência política.

Com o golpe da República, o Senado não foi extinto. Era preciso proteger os “republicanos” que vinham de muita influência durante o Império. Deixou de ser vitalício e passou a ser quase vitalício, como é até hoje.

A aristocracia rural e a atividade comercial urbana, sustentáculos do império, tomaram as rédeas do novo regime.

Rui Barbosa, Campos Sales, Bernardino de Campos, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Prudente de Morais, Deodoro da Fonseca, Francisco Glicério eram todos próceres do império. Eles e mais outros. E quem ficou fora das rédeas executivas foi arquivado no Senado.

É essa instituição, caríssima e inútil, que guarda a inexistente federação. Tudo de faz de conta.

São Paulo e Minas dominaram a “federação” após o golpe republicano, durante quatro décadas.

Com o golpe de 1930, falsamente chamado de revolução, morreu a república velha. Nasceu a federação? Coisa nenhuma. O Estado Novo sepultou o morto-vivo. Ou natimorto. Getúlio queimou as bandeiras dos Estados e aboliu seus hinos. Era a declaração oficial de que “essa merda nunca existiu”.

A ordem constitucional nascida em 1946 começou a preparar o amadurecimento institucional. Com todos os defeitos da nossa formação, foi o único período da história brasileira que mostrou a cara brasileira do seu povo.

Mas o amadurecimento foi interrompido. Brutalmente, em 1964. A federação foi habitar os quartéis. E, como no império, só sobreviveram, em paz, os sustentadores e bajuladores do poder dos coturnos.

E quando caiu fê-lo negociando com os que assumiram o poder e o entregaram a seus descendentes, na nossa capitania contemporânea. E não existe capitania federativa. Té mais.

Na Coluna Plural, do Novo Jornal.

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