terça-feira, 17 de março de 2015

Cabimento e condições: o Impeachment da Dilma por um fio


Terça, 17 de março de 2015


O país vive mais um turbulento capítulo em sua democracia. Desde o final de 2014, após o resultado eleitoral, um forte sentimento nacional, criado principalmente em razão do embate eleitoral e divisão social, vem reverberando em mobilizações pró-impeachement da presidente.

Há nesse contexto legitimidade em ambos os lados; os que a atacam sustentam seu discurso majoritariamente no estelionato eleitoral (mentira). Algo típico das eleições brasileiras: vendem um produto (candidato/a) pela via da hipermaquiagem publicitária, sob o engenho nacional da divisão maniqueísta do “nós contra eles”, mas que, objetivamente, para quem está mais sólido na análise dos projetos é razoável perceber não haver grandes diferenças dos métodos e narrativas macroeconômicas; bem como é compreensível que haja engajamento militante em defesa do projeto democraticamente eleito para governar a nação, mesmo que através da mentira aplicada na campanha, comprovada nesses poucos meses de gestão onde o governo buscou rapidamente lançar mão de uma agenda nociva ao povo brasileiro, por instrumentalizar aspectos de risco recessivo e inflacionário.

Transversalizando esse processo dualista de defesa e ataque ao governo central, Dilma, reconhecida pela inabilidade de articulação política, sobrevive, junto ao seu dirigente – Lula, as constantes denúncias da Operação Lava-Jato, que investiga desvios na Petrobrás, e que para mim tem aspectos parecidos com a Máfia Italiana, de maneira a buscar se blindar sob todos os aspectos que os desvios alcancem sua pessoa.

Ou seja, todos os pontos apresentados até aqui são eminentemente políticos. Cabe então analisarmos se há embasamento jurídico para que esse caldo de insatisfação e mobilizações populares, similar ao de 1992 no impeachement de Collor, se torne material para processo de cassação. Em 1992, o contexto era muito parecido, escândalo de corrupção, desvios, propina a políticos, e indicações de cargos públicos (nada diferente de todos os governos em seus diferentes níveis), mas a diferença é que o material probatório se tornou mais robusto quando se comprovou que as contas utilizadas no esquema coordenado pelo tesoureiro de Collor, o “Pc Farias”, não foram sequestradas como as demais do povo brasileiro.

Desde então, a população assistiu a um conjunto de mentiras assumidas de público, e nem por isso foi pautado cassação de seus responsáveis, políticos de todos os matizes ideológicos utilizam deste expediente como prerrogativa de vitória eleitoral e de governabilidade. Para muitos até, a lógica da disputa política é compreendida exatamente por quem consegue mentir com o menor efeito ofensivo. Mentiras à parte, não existe cabimento legal que tal estelionato possa ser objeto de impeachement, mesmo que a mentira esteja travestida de culpabilidade, o dado concreto que pode fundamentar o processo de cassação é exclusivamente material, com indícios de dolo, de vontade de cometer ou encobertar ato ilícito.

Como sabemos, a história pode repetir os cenários, o caso em questão envolve a divisão dos cargos públicos, propina para políticos, envolvimento de agentes públicos na corrupção e até mesmo o tesoureiro que participou da campanha. Em um volume de desvio sem registro na história das democracias, este escândalo ainda não se materializa de modo a alcançar com elementos probatórios de dolo a presidente, a ponto de ser instaurado processo de cassação. Ainda!

Essa ideia de golpe, de causar pânico na população, não resultará na desmobilização dos setores pró-impeachement. O perfil de esclarecimento da militância envolvida não permite esse tipo de estratégia, ainda que neste perfil, muitas vezes é perceptível sopros de ignorância política com o apoio a intervenção militar, algo repudiável sob todos os aspectos, mas reflexo do repudio e heterogeneidade latente na sociedade brasileira.

Na esteira do tensionamento político, a discussão alcançou a demarcação jurídica, que sem uma definição concreta e explicita acerca das condicionantes e embasamento do impeachement, reitera a lógica política: uns vêm material suficiente para cassação, outros não. Isso acontece primeiro por que a legislação que trata da matéria não especifica tais condicionantes objetivamente; segundo por não haver nada que incrimine, ainda que por culpa (imperícia, imprudência, negligência ou omissão), pela via da intenção dolosa. Não se trata de retirar a responsabilidade da presidente, desde o período em que foi Ministra, presidente do Conselho Administrativo da Petrobrás, mas sim compreender que responsabilidade jurídica e política não pode ser traduzida em culpa. É preciso a existência de material onde a refutabilidade esteja apenas na hipótese, como no caso do sequestro de todas as contas nacionais e a “coincidência” na manutenção das contas onde o esquema de Collor era operado. Mas, sobretudo, é preciso vontade política; construção de maioria política a partir da manifestação popular no congresso, para só então existirem condições mínimas para um processo dessa envergadura.

Este final de semana pode representar o gatilho necessário para alavancar tais condições. Hoje, 13, foi a vez dos que defende o governo Dilma, organizados por centrais sindicais e organizações políticas; domingo será a vez dos contrários ao governo, desaparelhados das estruturas governamentais de poder e articulados pelas redes sociais. A diferença pode não estar exatamente no quantitativo mobilizado em tais eventos, mais efetivamente na repercussão que as mídias (tradicionais e alternativas) consigam materializar.

O central, portanto, é compreender que tanto os que se mobilizam via redes sociais, contrários ao governo, quanto militantes partidários pró-governo e os que receberam suas diárias para engrossar as fileiras desta sexta-feira treze, são os responsáveis e culpados por escrever este capítulo da democracia brasileira.
Advogado - Comissão de Direitos Humanos Oab/Ba
Especialista em Gestão Pública-Uneb
Mestre PPGEISU/UFBA
Imjoa - Instituto Marias e Joanas

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